Conheça a trajetória de um dos fotógrafos mais influentes do cenário do rap e do funk brasileiro na atualidade
A fotografia é uma das linguagens mais importantes,democráticas e inclusivas que existem. Isso pela facilidade de sua compreensão. Mesmo alguém que não foi alfabetizado consegue interpretar uma fotografia pelo que há nela. A fotografia transforma quem enxerga, mas, antes disso, muda a vida de quem está por trás das lentes. Jef Delgado é um exemplo disso. Cria da periferia de São Paulo, o jovem fotógrafo e produtor audiovisual tem se mostrado um diamante que vem sendo lapidado constantemente e colhendo belos frutos. A história por trás das lentes de Jef Delgado.
Aos 23 anos, Jef é responsável por fotografar grandes referências do rap e funk nacional. Atualmente compondo a equipe do Mano Brown e cobrindo grandes eventos do cenário, Jef tem conquistado admiradores do seu trampo nos quatro cantos do país. Mas, antes disso, poucos sabem como foi sua trajetória. Hoje, empreendedor e líder de uma equipe, Delgado faz questão de ressaltar como foi sua infância e adolescência na favela.
O início
O artista iniciou na fotografia ‘meio sem querer’, como ele mesmo diz. Segundo Jef, tudo começou a fluir após seu pai lhe presentear com uma câmera cyber-shot. Simples, mas que no fim das contas ia transformar sua vida.
“Eu não tinha pegado a visão que foi para influenciar na fotografia. Mas, ali, ele plantou uma .sementinha sem perceber, tá ligado. Depois comecei a gostar, fotografar muito com o celular também. Aí que eu fui percebendo que tinha um olhar sobre o mundo, sobre o centro da cidade, sobre um pouquinho de skate sobre os prédios” conta Jef.
Responsável por marcar para história clicks de nomes notórios como o próprio Brown, Emicida, Tássia Reis, o ex-presidente Lula e tantos outros grandes nomes da cultura, Jef vai traçando sua carreira de forma sólida, mas sem deixar de lado a humildade.
O artista comenta ainda que, hoje, se enxerga como um artista, mas nem sempre foi assim.
“Pô tudo aconteceu tão rápido na minha vida. Tipo, criar conteúdo de uma forma orgânica sabe, toda essa responsabilidade de ser parte de algo. Assim que tudo aconteceu, muito rápido mano. E eu fui colhendo e plantando de forma estratégica. Mas, claro, sem perder a minha origem” frisa.
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Contato com a arte
Nas suas histórias do instagram, Jef volta e meia comenta sobre sua trajetória e tenta conversar com seu público de modo a inspirar. Numa dessas trocas de ideia, ele contou que já chegou a ser expulso da escola. Isso mostra que, para um sistema onde rótulos e padrões são impostos, e pessoas são julgadas por notas, muitas vezes perdemos grandes talentos. Por felicidade, não foi o que aconteceu com Jef.
Mas, é importante frisar também a importância da escola na vida do artista. Foi nesse ambiente que ele foi tendo contato com a pluralidade das artes, fez visitas a museus, exposições, mesmo que isso tenha acontecido pra ganhar um ponto no final do bimestre. Ele conta que esses primeiros contatos foram essenciais para ele desenvolver sua consciência e perceber como tão poucas pessoas, como ele, pretas e de periferia, estavam presentes em ambientes como esse.
Apesar do start para arte ter vindo anos antes, foi entre 2014 e 2016 que começaram as grandes apostas de Jef Delgado. Disposto a fazer o que fosse necessário para se inserir no cenário da arte, o fotógrafo começou a entrar de penetra em bailes e festas para fotografar. Desse modo, o único objetivo era tirar algumas fotos brabas e criar um portfólio. Além de curtir um pouco, é óbvio, já que ninguém é de ferro.
O rap e o funk por meio da fotografia
Com um plano em mente, e cara de pau para se jogar nesse mundo, Jef foi se conectando ainda mais no cenário da fotografia através do funk, e , futuramente, no rap. Gêneros irmãos, o funk e o rap sempre fizeram parte da vida de Jef, assim como faz de grande parte dos brasileiros nas periferias de norte a sul. Dessa forma, fotografar os ídolos em cima dos palcos era algo fora de série para o jovem.
A partir desses rolês, tirando fotos em bailes e nas ruas, da realidade periférica, Jef foi ganhando experiência e se descobrindo na fotografia. Desse modo, conseguiu se inserir dentro da cena. Assim, dando as caras, conseguiu uma vaga pra trabalhar na Kondzilla, onde permaneceu por alguns tempos. Contudo, o que ele não esperava era que enfrentaria um momento de incertezas e auto-sabotagens por conta de uma crise depressiva.
Nada fazia sentido para ele naquela circunstância. Um momento depressivo, aliado a um ambiente ruim no trabalho, como ele conta, o levou a sair da Kondzilla e voltar a trampar de forma independente. Como todo artista, o fotógrafo também enfrentou altos e baixos.
Contato com ídolos
Em 2019, em um momento conturbado pessoalmente, veio um grande convite que iria mudar de vez sua vida, compor a equipe que iria para a turnê das três décadas dos Racionais. Não bastando isso, Jef também fotografou o show de apresentação do álbum Amarelo, de Emicida, no Teatro Municipal. Era uma virada de chave inesperada para o artista.
Nesse momento Jef pisou o pé no acelerador, como ele mesmo conta. Foi aí que ele investiu de vez no corre. Comprou e alugou lentes novas e foi em busca de se aprimorar:
“Já sabia que era a fotografia na minha vida. Então eu fui mais para cima. Aluguei uma lente mais f*da ta ligado. Foi aí que eu consegui entregar as melhores fotos da minha carreira. O que passava na minha mente era, mano, quero muito conseguir virar essa chave, assim, de ver minha arte nas paredes”
Nessa época parecia que Jef Delgado já estava prevendo grandes acontecimentos. Hoje representando artistas, influenciadores e personalidades de todo o Brasil pelas suas lentes, o fotógrafo narra histórias e marca sua geração com clicks de muita personalidade e uma assinatura inconfundível. Desse modo, alinhando a estética periférica a toques sensíveis de edição caricatas do hip hop, é impossível não reconhecer seu trabalho numa obra.
A história por trás das lentes de Jef Delgado
Vale lembrar que o ramo da fotografia sempre foi elitista. Antes, para se fotografar eram necessários equipamentos de ponta. Hoje, com o advento dos celulares e da internet, as obras se popularizam e chamam os olhares de todo o mundo. Mas, mesmo com a mudança desse cenário, muito ainda deve ser feito no ramo. Jef faz uma reflexão sobre negros na fotografia e em espaços que antes eram privados.
“O negro vivo que consegue se manter com um nome assim, já é um legado. Eu quero que as próximas gerações me vejam como exemplo mesmo. Claro que é como estar no ‘olho do furacão’, é muito difícil também se manter. Chegar é difícil, mas se manter também é um grande desafio. Mas a gente pode. A gente consegue”
Por fim, Jef Delgado fala sobre sua responsabilidade: Tenho meus pecados, minhas contradições, mas sempre buscando acertar. Sempre em busca de ser espelho para várias pessoas. Eu acho que é isso. Cada mensagem que eu recebo é muito satisfatório. Esse é o meu corre. Me faz feliz. É isso, é marcha nos progresso. Não pode parar”.
Você pode conferir mais obras de Jef Delgado no seu insta: https://www.instagram.com/jefdelgado/
Uesley Durães